Pe Dimas - Joaquim Dimas Guimarães II

JOAQUIM DIMAS GUIMARÃES. 
Pedro Maciel Vidigal
 Os Antepassados II Volume pag. 449.


Amava a comunidade cuja direção espiritual lhe fora confiada por seu Bispo. Amava-a muito muito, mesmo. Notável sob todos os ângulos, a sua caridade para com ela. 

Foi Cônego honorário do Cabido da Sé de Mariana e Capelão de Sua Santidade o Papa, como Monsenhor. Nasceu no dia 26 de março de 1906, na Fazenda Itajuru, situada no território do Distrito de Brás Pires-MG. E foi batizado, no dia 30 do mesmo mês, pelo Padre Francisco Lopes da Silva Reis. 

Desde menino, nele campearam os bons costumes. Tinha 16 anos de idade, quando entrou no Seminário de Mariana, em março de 1922. E, ali, se destacou assim no estudo como na piedade. 

Com sua extraordinária inteligência, foi aluno distinto nas aulas das Humanidades e das Ciências. E nos exames, a que era submetido em cada semestre, conquistava as melhores notas 

Dois anos antes de terminar o curso Teológico, foi-lhe confiada pelo Padre Reitor do citado Seminário a regência da cadeira de Matemática, matéria por que ele sempre manifestou a sua predileção. Pois ela habitua a raciocinar com rigor e a exprimir com precisão e clareza o pensamento. Além disso, sob o ponto de vista moral, é a Matemática um elemento importante na educação do homem, levando-o a procurar a verdade e ter opinião própria sobre os assuntos que estuda e a não aceitar, sem exame, a opinião dos outros sobre aquilo em que pretende ser esclarecido. E por sua forma lógica perfeita e pela precisão e limitação dos postulados em que se assenta, e a ciência mais apropriada à análise psicológica do espírito humano. Lecionando-a, conseguiu fazer que os seus alunos a amassem, pelo que tem de útil, e por ela se apaixonassem, pelo que tem de belo. Os antigos filósofos divinizaram-na, considerando-a como linguagem dos deuses. 

Desde que foi ordenado presbítero, no dia 30 de novembro de 1931, por Dom Antônio Lustosa, então Arcebispo de Belém do Pará, manteve, até morrer, diário e cordial convívio com Jesus Cristo, pela Eucaristia, e com Nossa Senhora, pela recitação do terço do santo rosário. 

Bom, sereno e humilde, mostrava no exterior, sem fingimento, por palavras e obras, o que tinha no coração. 

Coadjutor do pároco de Leopoldina, em 1932, e vigário de Guaraciaba, desde 1933 até junho de 1979, cuidou de cumprir todos os seus deveres. Modesto, nunca estendeu as asas de suas aspirações fora dos limites do possível, e nunca saiu da esfera do bom senso. A modéstia é uma virtude que governou todas as suas ações, de modo que não passassem a excesso nem chegassem a ter defeito. Nele a consciência era a lei com que o seu entendimento se governava. E com esta lei interim, regulava todas as ações em ordem ao Fim Último: Deus. 

Foi jardineiro de virtudes, pois sabia cultivá-las com carinho e com naturalidade. Nele, impossível dizer qual delas foi a maior. Parece-me que destacar uma seria agravar as outras de igual estimação. Teve-as, todas no mais elevado apreço, visto que aprendera de São Gregório que faltando alguma desaparecem as outras: Nulla virtus est vera virtus nisi alias sit admixta. Até os pagãos pensavam assim a respeito das virtudes, que eles praticavam. Deviam estar de tal modo encadeadas que, tendo-se uma, todas as outras eram possuídas. De Plínio Júnior, esta observação: Cui virtus aliqua contingit, amnia contingunt. E, de Lúcio Floro, a mesma verdade em outros termos: Virlutes sibi invicem sunt connexae, ut qui unam habuerit, omnes habeat. 

Modelo na integridade de vida — vitae integer - o que mais impressionava em sua pessoa era o apostolado do bom exemplo, cuja eloquência persuade mais do que qualquer retórica por mais convincente que seja. A autoridade que se preza e que deseja ver levados a sério os seus conselhos ou as suas ordens, deve usar mais de ações do que de palavras. Pouco importa que ela mande bem, se agir mal, porque, com o seu procedimento, desmentindo o que manda, ensina a desobediência a quem pretender dirigir ou orientar. Suspeita tem de mau quem faz o contrário do que manda fazer. Pois se é bom, deve mandá-lo e fazê-lo. E se é mau, nem fazê-lo nem mandá-lo. Não há força maior que a do exemplo, que é mais poderoso que o preceito. Este o motivo por que Owen escreveu que sempre lhe agradaram mais os que ensinavam, fazendo, do que aqueles que procuravam persuadir, dizendo: Hi mihi Doctores semper placuere, docenda Qui faciunt plus, quam facienda docent. Não há eloquência que mais persuada que a do exemplo. Qualquer ação ouvida comove menos que a ação vista, bem observada. Foi o que disse Horácio, nestes versos: Segnius irritant animes demissa per aurum, Quam quae sunt oculis sub jecla fidelibus. 

Nele também era impressionante o ministério da palavra, exercido dentro e fora da Igreja Matriz de sua paróquia, nas visitas a famílias e em qualquer oportunidade. No púlpito, lias, no confessionário, na hora da agonia de muitos enfermos e até na rua, quando se encontrava com pessoas que gostavam de receber seus bons conselhos. Escutando-os e pondo-os em prática, quem os pedia verificava logo o acerto do que, no versículo 12 do Capítulo IV dos Provérbios, disse Salomão, comparando com a pérola a palavra lançada a seu tempo: Qui loquitur verbum in tempare suo, in auris aurea, et margaritmn fulget. Dados na hora certa e sem paixão, os conselhos, na verdade, são mesmo pérolas do tesouro da prudência. Quem ouvia as suas prédicas observava sua total fidelidade ao Evangelho e à mais pura doutrina da Igreja. E ficava imaginando que havia poucos sacerdotes iguais a ele. 

Sobretudo nestes últimos anos em que uma onda de estupidez e de imbecilidade invadiu furiosamente a nossa Igreja e a transformou no estuário de muitos erros responsáveis pela descristianização de grande parte do povo E em que, procedendo como camelôs de novidades incríveis, muitos padres se tornaram empreiteiros da completa temporalização do cristianismo. Seu visível interesse pelo bem-estar terreno e pela felicidade eterna de todos os seus paroquianos levava-o a convidá-los para a meditação do belo futuro, que lhes está preparado. Seu maior esforço era para fazê-los ficarem cientes de que esta vida é urna navegação de que a Bem-aventurança é o porto; uma carreira de que a Eternidade é o termo, uma batalha de que a Salvação é a vitória; uma escada de que o último degrau é a Glória; um edifício de que o Céu é o teto. 

o grande e único objetivo de seus trabalhos consistia em fazer o povo de Guaraciaba viver o verdadeiro cristianismo dentro da Igreja Católica, naquela certeza de que Cristo não pode ser separado de sua verdadeira Igreja. Pois se o mundo não viver o cristianismo vivo na Igreja, ele morrerá do cristianismo corrompido fora da Igreja. Foi o imortal filósofo Jacques Maritain quem deixou escrito em uma de suas famosas obras "Trois Reformateurs — Luther, Des-cartes, Rosseau": Le Christ ne pe,ut pas Ore separé de son Eglise. Le Christianisme n'est vivant aue dans l'Eglise, hors d'elle il meurt, et comme tout cadavre il entre en deliquescence. Si le vant dans l'Eglise, de l'Eglise monde ne vit pas du christianisme vi-meurt du christianisme corrompu hors.

Amava a comunidade cuja direção espiritual lhe fora confiada por seu Bispo. Amava-a muito muito, mesmo. Notável sob todos os ângulos, a sua caridade para com ela. Bem dizia o santo e sábio Dom Silvério Gomes Pimenta em uma das páginas de seu livro "A vida de Dom Antônio Ferreira Viçoso": A caridade é tanto espiritual como corporal, esta mais visível e mais fácil de ser conhecida, mas ambas andam tão juntas que impossível é encontrar quem busque o bem espiritual do próximo e não trate quanto é em si de remediar no particular do tempo. O intento da caridade se manifesta pelo tamanho e pela qualidade das obras. E elas lá estão no Município de Guaraciaba para serem vistas por quem tiver olhos para vê-las. Para serem miradas e admiradas por quem souber avaliar bem a importância social de todas elas. Entre as muitas já inauguradas e em pleno funcionamento, permito-me citar o Hospital Sant'Ana e o Ginásio para o ensino das matérias do primeiro e do segundo graus, cujas sedes foram construídas e bem equipadas por ele, com os recursos financeiros do governo da Nação, conseguidos pelo autor deste livro, quando no exercício do mandato de deputado federal e Juscelino Kubitschek era Presidente da República. A saúde e a higiene do povo e a instrução aos meninos e aos jovens sempre lhe mereceram especiais cuidados, só inferiores aos cuidados com que sempre zelou o bem das almas. Principalmente a instrução. Porque, sem ela, o homem é um pequeno mundo sem luz, em que não aparecem as estrelas, porque se ignoram as verdades e em que não são enxergados os precipícios porque não se conhecem os enganos. Pequeno mundo em que o vício é equivocado com a virtude e a realidade com a aparência. Em que a vida do ignorante é como noite contínua porque são cegueiras todas as suas ações. 

Deus preparou Monsenhor Joaquim Dimas para ser o maior benfeitor e incansável servidor de todos os guaraciabenses. Durante quase cinqüenta anos, os seus paroquianos tiveram-no na mais alta conta, estimando-o como líder religioso, cura e conselheiro, diretor espiritual e amigo de todas as horas, em cujo coração os sofrimentos mais íntimos eram derramados. Para todos eles, foi o médico que sabia curar as enfermidades do espírito, piores que as do corpo. Se, por acaso, encontrou corações duros ou de ferro, fazia que ficassem abrandados com o fogo da sua bondade. Santo Agostinho costumava dizer: Nihit est tam duram atque ferream qtzod amoris igne vincular. Conquanto o Eclesiastes nos recomende que não devemos louvar qualquer homem antes de sua morte, posso e devo afirmar que Monsenhor Joaquim Dimas, antes de sua alma voar para o Céu, fez por merecer todos os louvores, por causa de sua vida irrepreensível e de suas preciosas e grandes obras a favor da dilatação do Reino de Deus nas almas e da valorização do homem, que é o maior patrimônio de urna nação civilizada. Com tantos trabalhos que realizou, deixou aos pósteros a perpetuidade de um nome honrado, que a boa fama já se encarregou de fazer conhecido, em todo o Brasil. Faleceu, no dia 30 de junho de 1979, vítima de uma parada cardíaca. 

A Igreja Militante, na Arquidiocese de Mariana, perdeu um grande sacerdote e um de seus melhores ministros. Mas a Igreja Triunfante, no Céu, ganhou mais um santo, cuja pureza de vida, aqui na Terra, podia ser comparada com a pureza dos anjos.



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